Heartbeat: nova série médica da NBC

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Heartbeat é a nova série médica da NBC. Com quatro episódios exibidos até agora, é meio cedo para saber se ela vai vingar, mas a série é boa o suficiente para merecer um texto de primeiras impressões. À primeira vista parece uma cópia barata de Grey’s Anatomy, mas dependendo do rumo que ela tomar pode ficar muito boa.

É impossível não fazer comparações com a grande série médica atual. Em Heartbeat a protagonista, Alex Panttiere, é uma médica loira, impulsiva e destemida. No passado, quando ela ainda era residente, se apaixonou por um chefe médico. Depois de dez anos ele volta como cirurgião-chefe do hospital em que ela trabalha como médica-cirurgiã especialista em transplante de coração. Ela tem dois filhos do ex-marido, que revelou ser gay. Alex namora um outro médico que trabalha com ela no hospital, e agora, nitidamente, o problema é decidir entre o amor novo ou o antigo.

Pesquisando no google descobri que a protagonista é baseada em uma médica real, chamada Kathy Mangliato, praticamente uma celebridade do meio médico. Acho que isso não importa muito para história, afinal, nos primeiros episódios já ocorre tanta invencionice que acho difícil que a história da médica verdadeira esteja sendo levada muito em conta. E claro, isso não deixa a série pior. Assim como acontece em Grey’s Anatomy, a inverdade mascarada de realidade dá o tom perfeito de desvario aceitável. É como se por quarenta minutos você aceitasse toda a extravagância possível que eles te oferecem, porque é isso que você quer, tipo aquela famosa frase: tevê é para fugir da realidade, ou de um dia cansativo. Para mim, ver Grey’s Anatomy, ou acompanhar Heartbeat se tudo der certo e a série não for cancelada logo,  é o mesmo que assistir a uma novela da Globo. Continua sendo televisão, no melhor sentido possível.

Se assim como eu, você é fã de Grey’s Anatomy, a chance de gostar dessa estreia é grande. Infelizmente, Heartbeat peca exatamente onde a série da Shonda fez escola. O elenco de apoio – que dependendo do futuro da série pode deixar de ser apenas de apoio – é completamente estereotipado. A amiga da Alex Panttiere e enfermeira é oriental, o interesse romântico dela não é um homem atraente como são os dois da protagonista: ele é velho e meio acabado, mas a série parece pensar que, por ela ser asiática, tudo ok. O negro, que na tevê não raro é o personagem que só serve para ouvir as lamentações do protagonista, é psiquiatra muito convenientemente: assim ele pode fazer o papel de sempre, não ter qualquer arco próprio, sem parecer que está ali apenas para ouvir os protagonistas. Muito engenhoso, hein! Em Grey’s Anatomy, nós sabemos que negros não são apenas peças decorativas. Mesmo sendo protagonista, Meredith precisou muitas vezes ouvir seus amigos e aconselhá-los: eles têm problemas, tempo de tela, desenvolvimento dramático para além de estereótipos. Assim, o elenco de apoio deixou de ser apoio há tanto tempo que agora sabemos que Grey’s Anatomy é da Meredith Grey e de mais um punhado de personagens.

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Talvez Heartbeat esteja bem abaixo da sua concorrente (NBC x ABC), mas para uma viciada em séries, acho que vale a pena. Não é hora de investir muito afeto em uma série que apenas começou,  mas é bom acompanhar porque, ao longo do tempo, esses defeitos podem se ajustar e aí a série muda para melhor. Vários bons elementos ela já tem: os atores principais são carismáticos e têm química, os casos episódicos até agora foram interessantes, o texto é ágil e não extremamente esquemático. Se você é como eu e curte ouvir umas “lições de vida” narradas em off enquanto uma médica abre o peito de um paciente, com sangue e tudo, vale a pena prestar atenção.

Atualização: Heartbeat foi cancelada, mas eu já tinha desistido da série depois do quinto episódio. Desandou muito rápido.

Love estreia na Netflix

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O cara é normal ou feio e está sempre na dele, um tipo talentoso que ainda não teve sua grande oportunidade; a menina é linda, maluquinha e capaz de tomar as piores decisões do mundo. O cara encontra a menina. Quantas mil vezes você já viu esse casal, no cinema e na tevê? Love, série que estreou na Netflix, tentou ser uma crítica aos clichês da comédia romântica, mas acabou celebrando os aspectos mais datados do gênero – ou sem querer, ou meio que achando que a gente não ia se dar conta.

Fazia tempo que eu não sentia tanta raiva de uma série. Uma raiva que eu posso apontar para todos os lados. Para a série, para os personagens, para a história, para o criador, e sobretudo para mim, por assistir os dez episódios em um fim de semana. Mas vamos por partes.

Judd Apatow e Paul Rust escreveram a série. Rust interpreta Gus, o personagem principal, aquele que vai conseguir vencer suas inseguranças (ou sua apatia, já que a série parece sugerir que todo mundo é apático hoje em dia) e ficar com a garota. Claro, a garota é muita, mas muita, mas muita areia para o caminhão dele, bem ao estilo de produções de homens feitas para homens. Tudo bem, eu sou a primeira a dizer que a televisão tem que mostrar gente que se pareça com gente, mas quando esse parâmetro parece reservado aos protagonistas masculinos não tem como disfarçar o incômodo. Gus está cercado de mulheres lindas, e ele é tipo um Geddy Lee que cortou os cabelos. Mickey, a menina excêntrica que só toma decisões ruins, é interpretada por Gillian Jacobs, que muita gente conheceu em Community. Ela é a típica garota do dedo podre. Isso até faz sentido para a personagem, mas não deixa de ser sintomático. Na cultura pop, faz uns mil anos que o homenzinho ansioso e inseguro, no fim das contas, consegue a garota – nem que seja apenas pra ela se decepcionar amargamente.

https://twitter.com/MarieColette/status/701474732063870976

Com essas informações, a gente não precisa de uma sinopse muito completa. Garoto encontra garota já me faz parar para prestar atenção – acho que não sou a única. Sou fã de comédia romântica, mas já tenho mais do que um pé atrás com o Judd Apatow. Freeks and Geeks (que não é comédia romântica, mas é a estreia de Apatow) tem lugar especial no meu coração; até onde eu lembro, O virgem de 40 anos é legal. Todo o resto, porém, e sem exceção porque eu tô com uma aba do navegador aberta nos créditos dele no IMDB, tem aquela carinha de falsa comédia com mensagem edificante embutida. Ou melhor: aquela carinha de família de comercial de margarina dois-ponto-zero. Tem problema? Não necessariamente. Tem graça? Não.

No caso de Love, embora sem grande mensagem edificante, há uma tentativa de criticar a maneira como as pessoas se relacionam atualmente. Essa é a reviravolta aqui: de Love, só o título. O que os protagonistas buscam, quando parecem buscar amor, é outra coisa. Autoafirmação, talvez. Love parece dizer a todo momento: viu, espectador, viu?, todo mundo é egoísta, viu só? Aham, vi. Pode ser que a ideia toda seja conseguir elaborar um comentário às pessoas que estão pelos 30 anos e agem como se elas e seus relacionamentos fossem a coisa mais importante do planeta. E isso é legal e poderia dar certo – Master of None é bacaninha, Take This Waltz, com Seth Rogen e Michelle Williams, trata de coisa parecida – mas talvez, para elaborar um comentário crítico, uma série não possa estar tão inebriada por aquele mesmo aspecto romântico e tolinho que ela está tentando criticar. Assim, o que poderia ser um novo olhar sobre os relacionamentos, é só, sei lá, algo irrelevante. Não adianta ser irônico e dizer que sabe que está lidando com um clichê, poxa, tem que fazer o tema andar para frente.

https://twitter.com/matsbri/status/701516788295720960

No fim, eu me vi irritada por ter passado o meu tempo com pessoas tão detestáveis. Gus e Mickey são horríveis e a série sabe disso. Eles estão ali para que a gente tenha, primeiro, uma ilusão de identificação e, depois, uma espécie de insight: meu deus, sim, essa geração é uma droga mesmo. Só que televisão nunca é só o que está sendo contado, mas também a forma como se conta: Love parece apaixonada pelos defeitos dessa gente, pelos clichês que eles representam, por seu próprio senso de ironia, pelos privilégios de que aquelas pessoas gozam mesmo sendo tão ruins.