Meses de poucos filmes

Já é dezembro. Eu esperei por Gilmore Girls: A Year in The Life durante boa parte do ano. Valeu a pena? Claro que valeu, mas tudo veio e foi num fim de semana do final de novembro. No sábado de manhã eu já estava com saudade. É triste. Dezembro é também a última etapa da minha meta de leitura,  a mais complicadinha e também aquela que eu não posso deixar de cumprir de jeito nenhum porque, se fracassar é triste, quase conseguir é pior ainda. Foi, aliás, a minha meta de leitura que me levou a dar uma segunda chance a Outlander, a série de tevê que tem ocupado a maior parte das minhas horas vagas nesse começo de mês. Daí o que acontece? Acontece que foi em setembro a última vez em  que se ouviu falar, aqui nesse blog, de um filme que eu tinha visto. Também é de setembro o último filme muito bom que eu vi: Amadeus, aquele em que Mozart dava uma risada esquisita e contagiante. O nome disso é negligência.

Eu gostaria que todo mundo soubesse que eu tenho, sim, visto muitos filmes, que eles foram indicações do Roger Ebert, que eu faço verdadeiras sessões de cinema + debate na minha casa com vários amigos cinéfilos e tudo, que nessas ocasiões cada um traz um ensaio de 5000 palavras, de próprio punho, e que é bem comum que nessas horas nós fiquemos lá, sentadinhos, rindo de você que vai ao cinema na estreia de Esquadrão Suicida. Rindo e comendo bolacha.

Mentira, hein? E eu vi Esquadrão Suicida. Baixei por torrent e vi. Foi ruim, foi o pior filme que eu vi em outubro. Mas para você ter uma ideia, de lá para cá foram apenas onze filmes. Os primeiros seis foram coisas de fim de noite rodando pela Netflix, mas os últimos cinco foram cortesia das pessoas heroicas que fazem o Legendas.tv. Às vezes eu  acho que alguém tinha que dar a chave do mundo na mão deles e aí tudo se resolveria com o tempo.

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Bridget Jones no limite dos Millennials

De qualquer maneira, a responsabilidade pela ruindade dos filmes não é deles. Então deixa eu contar o que é que tem passado aqui em casa. Num dia desses, eu achei que era uma boa pedida chamar o meu marido para uma sessão de O Bebê de Bridget Jones. Sabe, O Diário de Bridget Jones é um filme que eu aceitaria ver no meu último dia de vida. Tem personagens esquisitinhos e carismáticos, tiradinhas, aquela coisa inglesa que faz as coisas inglesas tão diferentes das americanas, tem o Hugh Grant no pico de seu charme e o Colin Firth no pico de seu charme que aponta na direção oposta àquela do charme do Hugh Grant. Não sei se me fiz entender? E aí fica aquele triângulo amoroso que cativa todo mundo. Além do mais, a Renée Zellweger está totalmente entregue: ela é a Bridget Jones, eu tenho certeza de que muita gente ainda a chama de Bridget Jones nos lugares de alto nível que ela frequenta.

Mas em O Bebê de Bridget Jones, nada feito. Zellweger está toda dura, o texto não ajuda e, diferentemente do que acontecia antes, ela parece mais preocupada em ser bonita do que em entrar no papel. Isso ela consegue: ela está muito bonita, fina, uma verdadeira aparição (e por falar em beleza, esse filme ainda tem o Patrick Dempsey, o meu Dr. Shepherd de Grey’s Anatomy). Só que ela não é a Bridget Jones, e a diretora, que é a mesma do primeiro filme, deve ter  sido trancafiada num quarto escuro e obrigada a assistir àquele Vizinhos (com o Seth Rogen e o Zac Efron) até entender o que é que eles acham que o pessoal que vai ao cinema hoje em dia está com vontade de assistir. Ficou esquisito e constrangedor.

Depois disso, eu vi um filme coreano, O Túnel. Esse tem a sinopse mais fácil: um homem fica preso em um túnel. A equipe de resgate faz o maior esforço para tirá-lo de lá, e a  esposa dele, do lado de fora, tenta não perder as esperanças. Um filme catástrofe com uma mensagem edificante, O Túnel poderia passar na Sessão da Tarde. Tem um Pug fofinho e a Doona Bae, aquela de Sense8 e O Hospedeiro.

I Am a Hero, um filme japonês de apocalipse zumbi, foi uma perda de tempo. Aquela coisa: o cara de uns 30 e poucos anos é um pateta no dia-a-dia, chega o fim dos tempos e ele toma umas lições para deixar de ser pateta e conquistar a garota. Tudo isso com referências pop, gore e uma pitada deZZzzZzzZ. Só não digo que o filme foi um prejuízo total porque os zumbis de I Am a Hero como que guardavam certas obsessões do tempo em que eram gente. Isso rendeu pelo menos uma cena hilária em que um zumbi  taxista fica repetindo “Hospitalidade é tudo” ou algo assim.

Sabor da Vida, da diretora japonesa Naomi Kawase, é um desses filmes em que cada tomada é bonita e parece guardar um significado que nos foge. Eu não conhecia a diretora, que é meio badaladinha,  mas me empolguei porque em 2016 quase tudo de bom que eu vi veio do Japão ou da Coreia. No filme, um comerciante contrata uma senhorinha para fazer o recheio de um doce feito de feijão. Esse não encantou como eu achei que fosse acontecer, mas dar o play às 23h45 nunca ajuda.

A cereja do bolo é O Contador, com Ben Affleck e Anna Kendrick. Eu não consigo nem explicar o que acontece, não sem fazer tudo tim-tim por tim-tim. Na infância, Affleck foi diagnosticado com uma variedade de autismo que nunca fica totalmente clara para a gente. Só que o pai dele era militar. No que deve ser a pior forma possível de se criar um filho autista, o pai militar coloca a criança num rigoroso regime de treinamento em artes marciais. A gente pensa que tudo bem, que artes marciais ajudam a criança a socializar e a criar disciplina. Mas não. Não é judô na escola sob a supervisão de um adulto responsável: é soco na cara até sangrar enquanto a criança se balança e demonstra estar a ponto de explodir emocionalmente.Mas deu tudo certo, o menino cresceu e virou o Ben Affleck, que deve ter dois metros de altura e 120kg, e como ele sempre foi muito inteligente e com muita aptidão para a matemática, ele virou contador. Um contador num trabalho de escritório, né? Com aquelas coisas chatas de escritório e bunda na cadeira? Não: ele vira um funcionário de poderosas organizações criminosas, das quais ele ganhou milhões de dólares. A Anna Kendrick descobre uma falcatrua em uma empresa, ele vai lá fazer umas contas e… e está feita a trama: ele ainda tem todo aquele treinamento porradeiro da infância, e mata bandidos com as mãos e também tem uma mira espetacular e dá tiros de longa distância, e tem uma secretária com quem ele fala por viva voz: é ela quem cuida de toda a parte burocrática de ser um assassino-de aluguel-contador-autista-justiceiro-vingador.

Poderia ser um filme do Batman, e na verdade é uma mal disfarçada história de origem de super-herói com uma pitadinha de espionagem. É como a franquia Bourne, só que mais cafona e com o Ben Affleck no lugar do Matt Damon. Não tenho a menor dúvida de que O Contador é a tentativa de começar uma trilogia ou uma série maior. E é ruim? É muito ruim e foi muito bom.

Eu tenho certeza de que os filmes que tenho visto nos últimos meses não vão estar em listas de melhores do ano, mas não tem problema. Quando eu vou ver filme aqui em casa o computador fica engatado na televisão, e eu nunca me lembro de comprar um mouse sem fio. Por isso quando eu me sento  determinada a só me levantar 1h30 depois, ninguém me segura.

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